
É de um contorcionismo da linha, guiada pelos universos do erotismo e da loucura, que Taigo Meireles, Helouysa Maria e Eduardo Belga tratam em Neurópira. Quais os limites do gesto na execução do desenho? Quais as fronteiras suportáveis da manipulação real e imaginária do corpo humano? Quantas possibilidades há nos modos de olhar? As investigações propostas pelos três artistas perpassam as perguntas em busca de respostas visuais.
Beatriz desce ao inferno para conduzir Dante pelos nove círculos da dor. O poeta se defronta com os pecados capitais e Taigo encontra na luxúria a matéria apropriada à linhas barrocas desenhadas em um gesto único e visceral. Se viver as paixões nos condena a eventuais descidas ao inferno, Beatriz no círculo da luxúria nos faz pensar sobre níveis de consciência e facetas do insuportável. Taigo procura contar uma história e nesse emaranhado de linhas lembra que, talvez, Beatriz não exista na forma de uma consciência única, mas represente as diversas faces do ego humano, no qual podem conviver a castidade e o erotismo, a fúria e a serenidade, a transgressão e a submissão.
Eduardo Belga passa ao largo da serenidade. Prefere a combinação brutal de erotismo e agressividade. Se apropria de reproduções de esculturas e pinturas renascentistas para provocar o cânone. Belga transforma a sensualidade de corpos perfeitos esculpidos em mármore em criaturas de feições entediadas e corpos grotescos. Penetrações e invaginações inusitadas surgem quando o artista intervém nas reproduções. Sodomia e torturas são testes de limites que Belga assume investigar. O que é interdito no mundo real se torna experiência automática no papel. Está aí o universo seguro para experimentar um ambiente homoerótico que o artista sabe ser alvo de tabus.
O tempo do desenho de Helouysa é real. Quanto mais se busca a origem das linhas, mais se mergulha na experiência temporal da artista. Quantas poses pode uma única linha traduzir? Quantas contorções pode o corpo realizar e manter em longos períodos de exposição? A interação entre o movimento das modelos e o correr da mão da artista pelo papel é fruto de precisão e sintonia, combinação imprescindível para chegar ao emaranhado espontâneo de linhas da série Os fantasmas da carne. Um voyeurismo confesso guia a artista, que aproveita a postura naturalmente oferecida pelos corpos retratados. Mas o retrato de Helouysa não se dá em 30 segundos. Não é matéria para ver e esquecer. É preciso ceder ao tempo do desenho para acompanhá-lo, compreendê-lo e degustá-lo.
Nahima Maciel.
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