sábado, 4 de julho de 2009

O surgimento e evolução do nu feminino na arte grega antiga

Os ídolos femininos de fertilidade do paleolítico e mesmo do neolítico seguiam a forma da famosa Vênus de Willendorf (figura acima). Nela, os atributos da fertilidade são destacados, como os seios grandes, o ventre alargado, o traseiro protuberante e vulva grande.

Contudo, os artistas cicládicos (2500 – 1100 a.C., arquipélago grego) criaram uma forma completamente nova de representar esse ídolo da fertilidade (Ídolo cicládico de Amorgos, figuras abaixo), fugindo completamente dos padrões e variantes ligados à Vênus de Willendorf.




O aspecto “magro”, com as delicadas nuanças de curvas, e as indicações suaves de volume no abdômen, seios e joelhos demonstra uma grande distância dos ídolos mais antigos de fertilidade. Não se sabe por que a cultura cicládica promovia a produção desse tipo de imagem, mas sabe-se que são as primeiras representações do nu feminino em tamanho real (e isso no segundo milênio a. C.) conhecidas na história da arte. Na verdade, seriam mesmo as únicas representações de nu feminino em escala real durante muitos séculos, e não surpreende que tenha sido nessas ilhas que começaram a surgir as imagens de Vênus para cultos religiosos, como a Afrodite de Praxíteles.

No período arcaico da arte grega, as figuras começam a ganhar requintes técnicos mais sofisticados, e a anatomia das figuras começa a assumir ares mais naturalistas. Os Kouros são representados com toda a nudez, mas as imagens femininas são representadas completamente vestidas, como a Kore de Chios (figura abaixo).


Contudo, a pintura em cerâmica grega permitiu uma maior liberdade para os artistas no que concerne a representação da nudez feminina, dos quais há vários exemplos nesse medium, como as cerâmicas abaixo, do século VI a. C.









Por vários séculos, ainda, as estátuas femininas não perderam seus vestidos e véus – mas isso até o período Clássico.

De Roma foi resgatada a escultura Filha de Níobe morrendo (figura abaixo), dos anos 440 a. C. É o primeiro nu em tamanho real de que se tem conhecimento na arte grega propriamente dita. A jovem, sendo atingida nas costas por uma flecha atirada pelos deuses, tenta arrancá-la a todo custo, e na luta deixa seus vestido escorregar pelo corpo. Contudo, a intenção aqui ainda não é celebrar o nu como ocorria nas estátuas masculinas, mas sim potencializar a sensação de dramaticidade da cena. A estátua pertence a um grupo escultórico.





Contudo, por pelo menos mais um século e meio, as figuras femininas continuaram vestidas, por mais sensuais que fossem representadas. Praxíteles, o famoso escultor, começou a mudar a tradição, ao representa ruma Vênus topless que teria sido encomendada pela cortesã Frine. Essa Vênus é conhecida como a Vênus de Arles (c. 350 a. C., figura abaixo), e também pertenceria a um grupo escultórico com Cupido e outras divindades.






No século IV a.C. os habitantes da ilha grega de Kos encomendaram ao famoso escultor Praxíteles (autor de Hermes e Dionísio, de Olímpia) uma imagem de Afrodite para o culto local. Praxíteles apresentou então duas versões: uma nua e outra vestida. Os habitantes de Kos, chocados, escolheram a versão vestida, e Praxíteles vendeu a versão nua para os habitantes da ilha de Cnido. Essa estátua ficou então conhecida como a Vênus de Cnido (c. 330 a.C., figura abaixo). A estátua tornou-se instantaneamente extremamente popular e criou um cânone para as imagens de nu feminino na Grécia antiga. A deusa é representada surpreendida no banho e pegando um pano para se cobrir. Sua mão direita esconde delicadamente seu sexo, mas o gesto da deusa, pelo contrário, acaba atraindo a atenção do observador para lá. Seu olhar, perdido, fez muitos homens apaixonarem-se pela escultura. Esta estátua foi a primeira representação em larga escala de uma figura completamente nua na Arte Grega, abrindo caminho para todos os nus femininos na arte ocidental. A estátua tornou-se tão célebre que tentaram comprá-la dos habitantes de Cnido diversas vezes, mas jamais conseguiram. A escultura original perdeu-se, mas foi tão amplamente copiada que diversas cópias antigas existem.






Os nus daí em diante variaram pouco do exemplo da Vênus de Cnidos. Uma desses nus é a famosa Vênus Capitolina (figura abaixo), que representa a pose conhecida como Vênus pudica, em que a deusa cobre os seios e a genitália. Essa pose perduraria por toda a história da arte, e sua versão mais conhecida está no Nascimento de Vênus, de Botticelli.




Outro exemplo, agora completamente inserido no Helenismo, é a espiralada Vênus de Milo(figura abaixo), do tipo Vênus Victrix, a Vênus vencedora, que ganhou de Athena e Juno o voto de Páris. Sua pose forma como que um espiral, e sua anatomia é mais naturalista que as Vênus anteriores.





Em seguida vemos a Vênus Esquilina (figura abaixo), apesar de que não temos certeza se é uma representação da deusa ou de uma banhista. O interessante aqui é que o nu é mostrado com bastante liberalidade, sem que a figura esconda sua genitália ou seus seios, mas parece na verdade exibi-los, ao atar a fita aos cabelos. Ela é difícil de datar, pois faz referência a diversos períodos anteriores da arte, mas é seguramente helenística, de acordo com os especialistas.






Ainda no tema da Vênus banhista, temos uma versão da Vênus pudica agachada (figura abaixo), que teve muitas variantes. Na mais comum delas, a deusa olha sobre o ombro direito enquanto esconde suas vergonhas com os braços direito e esquerdo, formando uma espiral, bem ao gosto helenístico.





Uma das versões dessa Vênus, pertencente ao Louvre, mostra a deusa como a se secar (figura abaixo). Vemos a partir daqui como a imagem da deusa deixa de ser idealizada para tornar-se cada vez mais uma obra de arte desligada de suas origens mitológicas, e voltada mais para o deleite. Outras versões, como a deusa secando os cabelos e pequenas peça em bronze, inundavam o mundo helênico e o império romano.





A Vênus Calipígia (figura abaixo) mostra a deusa tirando suas vestes e olhando para o seu traseiro. Por mais erótica e pornográfica que possa parecer a imagem, alguns escritores cristãos da Antiguidade registraram que de fato existia um culto religioso à Vênus Calipígia na Siracusa, região da Grécia Antiga. Afrodite Calipígia que dizer “Afrodite da bunda bonita”.




Daí em diante, infelizmente, não houve grandes mudanças em relação ao nu feminino na arte antiga. Um dos poucos sopros de criatividade é a Afrodite de Delos (figura abaixo), de 180 d.C, que mostra Vênus afastando com um chinelo as investidas Pã. Apesar de a pose ser derivada da Vênus de Cnido, o conjunto dá um sabor surpreendentemente bem-humorado e erótico à peça. Aqui, a deusa é mostrada mesmo sorrindo! Por incrível que pareça, esta escultura não foi criada para decorar jardins ou nichos como a maioria das esculturas anteriores, mas foi feita para um culto de adoração de Delos, como ainda é possível ler pela inscrição na base.




No império romano, podemos encontrar a última representação interessante de Vênus. É a Vênus Anadiômene (figura abaixo), a Vênus que surge das águas, pintura mural de Pompéia do primeiro século da Era Cristã, sendo provavelmente uma cópia de algum original grego. Aqui a deusa é heterodoxamente representada deitada, quando surge das ondas junto com os pequenos amores. A celebração do nu aqui parece claro, especialmente pelo contexto pompeiano, onde há diversas representações de cenas eróticas e de sexo. Não se sabe o contexto original em que esta imagem estava inserida.



[Marcelo G. Jorge e Naiara M. Coelho para a disciplina de História da Arte Antiga]

10 comentários:

  1. "evolução"? cuidado com a escolha das palavras, gente.

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  2. Laurem, evolução não quer dizer "melhoramento". Cheque o dicionário...

    "Evolução. [Do lat. evolutione]. S. f. 1. Desenvolvimento progressivo duma idéia, acontecimento, ação, etc.: A evolução do caso veio a mostrar que ele estava certo. 2. Movimento progressivo. [Antôn. (nesta accepç.): involução.] 3. Cada um de uma série de determinados movimentos harmônicos, ou que determinem a passagem de uma posição a outra: As evoluções do dançarino suscitaram aplausos; O aviador fez evoluções audaciosas [...]" (Dicionário Nova Fronteira). Marcelo

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  3. Que bom que as pessoas estão lendo nosso blog!!!

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. sim, júlia, leio esse blog sempre pra conferir se algo legal está sendo feito! afinal de contas, (teoricamente) todos os alunos - do CA ou não - devem estar atentos e ativos nas atividades propostas por outros alunos. não é mesmo??
    e não precisa me mostrar o significado, marcelo. eu tenho um aurélio aqui em casa. de qualquer forma, achei muito infeliz o uso da palavra "evolução", assim como o tipo de comparação que está sendo feito entre as imagens. talvez não ficasse melhor "retrospectiva do nu feminino"? enfim, é isso aí!

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  6. Calma, que ódio é esse... Eu coloquei a definição aí para poupar trabalho de vc ou de qualquer pessoa que aparecesse com a mesma dúvida. Cruzes.

    Quanto à escolha de palavras, eu discordo de você, mas fica a sugestão. Marcelo

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  7. que ódio o quê, marcelo? tá doido? só fiz uma crítica. e construtiva, ainda por cima! muito melhor do que só criticar é tentar ajudar, não é?!
    e não interprete tudo que sai de mim como coisas raivosas. eu sei separar o pessoal do "profissional"!!

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  8. Por favor me ajudem, preciso ver vários tipos de vestes masculinas gregas dos anos 400 ac. para uma peça teatral, passem e'mail se possível waltermoura.38@gmail.com
    Antecipadamente agradeço

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  9. meu puto isso não é arte grega mas sim égipcia

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  10. SOU PROFESSOR DE ARTE DA UFPI, GOSTEI DESTE TEMA E DA ABORDAGEM

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