sexta-feira, 11 de novembro de 2011

A CULTURA É NOSSO SANTUÁRIO Nota de apoio ao Santuário dos Pajés.



Nos últimos meses temos acompanhado a polêmica sobre a construção do Setor Noroeste em Brasília e os embates ente a comunidade indígena Fulni-ô, seus apoiadores e as construtoras responsáveis por algumas das obras do setor ocupado pelo Santuário dos Pajés. O motivo central do conflito é a não-demarcação da terra indígena dos Fulni-ô, a qual tem levado a invasões arbitrárias dos espaços reivindicados pelas famílias indígenas. Em tal contexto de negligência estatal, surgiu o movimento “O Santuário Não Se Move”, que visa a promover uma resistência pacífica às obras da construtora no local e intensificar o diálogo entre a comunidade do Santuário e a sociedade brasiliense.

Além dos conflitos legais sobre a legitimidade das obras, o que se supõe ser um bairro verde e uma solução à necessidade de estrutura habitacional na capital do Brasil - contraditórios argumentos que tentam mascarar uma cultura de corrupção em detrimento de interesses ambientais e sociais – levantamos o debate cultural soque o que temos acompanhado in loco, não só referente à situação da tribo Fulni-ô mas à situação de todas as nações Indígenas Brasileiras.

De todas as culturas que compõem a identidade brasileira a indígena foi sempre colocada à mais distante margem de nosso complexo social: as culturas nativas e originárias de nossa parte do continente hoje tem menos reconhecimento que aquelas que chegaram nos últimos 511 anos. Nos referimos ao racismo institucionalizado, a como a imagem do indígena é colocada em vários âmbitos: em todas as etapas de ensino, nas diferentes mídias e finalmente em nossas políticas públicas. Em pleno século XXI o “índio” ainda é sinônimo de atraso, isolamento, ignorância, precariedade, pobreza e algo que beira a estupidez; a figura do “índio” continua sendo a mais distante dos padrões de beleza brasileiros que abraçam amplamente o físico de origens europeias, africanas e até orientais.
Em nossa mídia, a imagem do “índio” ainda se parece com as gravuras dos tempos de colônia: o “índio” de verdade tem que andar “de penacho” (como dito pela revista VEJA domingo passado), seminu, de corpo pintado, não pode falar um português correto (quanto menos outras línguas), seu único calçado deve ser a sandália havaiana e sua roupa mais decente um short de futebol, suas roupas foram todas de doação - como se subsistisse de caridade.
À imagem do “índio” é vetada uma roupa que aqueça seu corpo no frio, um calçado que proteja seus pés, um par de óculos que corrija sua visão ou a proteja do sol, um relógio de pulso que lhe permita ver a hora, um telefone celular com o qual possa se comunicar... mesmo dos mais simples porque obviamente nossa cultura geral não lhe atribuiria habilidade mental para fazer uso das tecnologias mais recentes, tablets, computadores de ponta e acesso a internet.

É esta a cultura visual que ensinamos a nossas crianças nas escolas, nas novelas e no cinema, mas é essa a realidade de nosso pais? Nossos “índios” são realmente assim? Felizmente não: as nações indígenas brasileiras são extremamente politizadas, e lutam desde os tempos da ditadura militar (em que ainda eram considerados incapazes, sem direito a RG, CPF ou Carteira de trabalho: SEM DIREITO A CIDADANIA) pelo reconhecimento de seus DIREITOS HUMANOS, principalmente no que concerne sua CULTURA. São pioneiros na articulação para a manutenção e difusão de suas culturas, criando programas de apoio como educação bilíngue, extrativismo sustentável, e soluções sociais que estejam de acordo com seu intenso relacionamento com a natureza. Nossos indígenas são uma referência internacional, pela sua articulação política, e pela sua capacidade de sobrevivência frente a mais de 511 anos de situações adversas.

A arte indígena, assim como as nações que a produzem tem igualmente sido subjugada a conceitos colonizadores eurocêntricos: as ideias de folclore e artesanato tentam constantemente retirar a esses objetos seu significado mais profundo, inclusive estética e poeticamente, uma vez que apenas a antropologia parece ser autorizada a fazer seu estudo ou análise. Nas universidades brasileiras ão poucas as disciplinas de Arte, dentro de institutos e departamentos de Arte voltadas para o estudo, análise e discussão de nossa cultura “popular”, quanto menos de nossa cultura indígena.
Se no ensino superior de artes a arte indígena é pouco abordada, não podemos negar sua marcante presença em nossa produção artística nacional desde o modernismo até a contemporaneidade: a obra abstrata de Athos Bulcão, que ilustra nossos azulejos do Instituto de Artes, assim como a geometria de outros artistas de nossa cidade são referência viva da importância da cultura indígena no Brasil.

Por isso diante desta situação, reconhecemos a importância do mantenimento e apoio às ocupações indígenas em nosso país: o Santuário dos Pajés mais do que um território reclamado pelos Fulni-ô em Brasília tem sido um espaço aberto para todas as nações indígenas que passam por aqui para lutar pelos seus direitos e fazer uso de sua cidadania. Trata-se de um espaço sagrado para todos, um local onde a sintonia com a natureza e suas divindades espirituais é realizada. O Santuário também e uma casa representante do Encontro Mundial dos Pajés, organização que reúne representantes indígenas de vários países, continentes e culturas.

O papel político, cultural e espiritual do Santuário dos Pajés é de importância fundamental no coração da capital construída para mudar a cada do Brasil: vamos rever nossos conceitos.

O SANTUÁRIO NÃO SE MOVE!.

Centro Acadêmico de Artes Visuais da universidade de Brasília – CAVIS UnB.


Convidamos nossos colegas das artes e da cultura a conhecer melhor a situação do Santuário dos Pajés:

Próximos atos:
12 de novembro (Sábado)
Sarau Cultural com Zé do Pife e Juvelinas e ouros convidados.
Local: Santuário dos Pajés.

Link para o site do movimento “O Santuário Não se Move”:
http://santuarionaosemove.net/

Link para a Carta à população feita pelo movimento:
http://www.facebook.com/event.php?eid=179891772093189

Link para o grupo “O Santuário Não Se Move” no Facebook:
http://www.facebook.com/groups/176499372432960/?ref=ts

3 comentários:

  1. Muito lúcida essa nota. Que orgulho para todo brasileiro, quando perceber que na capital federal do nosso país existe um espaço político, cultural e espiritual conquistado pelos indígenas e seus admiradores. TERRA para quem vive nela. O Santuário não se move.

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  2. Não é porque comeram o pão que o diabo amassou que têm o direito a ocupar a área que quiserem. Esses índios não estavam aqui há pouco tempo atrás.

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  3. Nota sobre o Santuário dos Pajés e Menção de Apoio - Centro Acadêmico de Direito - UnB
    No último mês temos acompanhado os embates travados entre a comunidade indígena dos Fulni-ô (junto a seus apoiadores) e a EMPLAVI, empresa responsável por algumas das obras prediais do Setor Noroeste. O motivo central do conflito é a não-demarcação da terra indígena dos Fulni-ô, a qual tem levado a invasões arbitrárias dos espaços reivindicados pelas famílias indígenas. Em tal contexto de negligência estatal, surgiu o movimento “O Santuário Não Se Move”, que visa a promover uma resistência pacífica às obras da construtora no local e intensificar o diálogo entre a comunidade do Santuário e a sociedade brasiliense.

    Infelizmente, na última semana, presenciamos a retomada das obras pela EMPLAVI, a qual, aproveitando-se da cassação de uma liminar que paralisava os trabalhos no local até decisão definitiva, prosseguiu desmatando a vegetação nativa e invadindo a área indígena sob litígio. Esta segunda liminar, que concede às construtoras o aval para retomar as obras no local (desde que respeitem 4 hectares de área indígena, em vez dos 50 hectares demarcados pelo laudo antropológico), prejudica a própria demarcação posterior da área indígena, ou seja, prejudica o objeto da ação judicial. Isto é, a construção de prédios sobre a área indígena irá descaraterizá-la, fazendo com que a decisão de mérito sobre o reconhecimento e a demarcação perca sentido, restando impossibilitada a demarcação de uma área maior de que os 4 hectares concedidos liminarmente. Esse descaso judicial sobre o reconhecimento da minoria indígena e sobre a função social da propriedade é atentatório a nossa ordem constitucional, pois afronta os princípios fundamentais da pluralidade e do reconhecimento. Para além do desrespeito à minoria, a postura tem aval do Governo do Distrito Federal, o qual, além de não se posicionar em favor das famílias que ali vivem e desenvolvem suas culturas, se fez presente por meio da Polícia Militar, não só proibindo o acesso dos manifestantes aos recém re-inaugurados canteiros de obra (área indígena), como prendendo 13 estudantes de nossa universidade no local (um dos quais foi abordado violentamente pela polícia em razão de filmar os acontecimentos).

    Diante dessa situação, que envolve uma série de outros problemas - tais como o PDOT aprovado com suspeitas de compra de votos; o déficit de moradias populares e a construção de um bairro que visa a gerar mais especulação imobiliária; o mito de um bairro verde; e, principalmente, o desrespeito com as comunidades indígenas (que mais uma vez parecem estar à margem de nossa Constituição) - o CADIR manifesta seu apoio à causa do Santuário dos Pajés.

    Os membros da gestão diretora do Centro Acadêmico têm ido ao Santuário constantemente e têm integrado os esforços conjuntos do movimento estudantil nessa resistência determinante às obras na referida área. Convidamos todxs xs estudantes de direito a fortalecerem esta causa, tanto através da presença nas reuniões e no Santuário, quanto pela participação no debate público sobre o reconhecimento desses direitos. Estaremos divulgando, por meio do i-CADir e de nossas outras mídias eletrônicas, os próximos eventos.

    Centro Acadêmico de Direito da Unb – CADIR


    https://www.facebook.com/notes/centro-acad%C3%AAmico-de-direito/nota-sobre-o-santu%C3%A1rio-dos-paj%C3%A9s-e-men%C3%A7%C3%A3o-de-apoio/190663311014834

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